Estamos vivenciando um período de desaceleração no mercado de venture capital devido à queda no mercado de ações, à inflação, o aumento das taxas de juros e outros. As valuations das startups estão caindo, as rodadas de financiamento estão diminuindo e algumas empresas — principalmente de tecnologia, estão congelando as contratações ou demitindo funcionários (o famoso layoff) na tentativa de aumentar seus lucros.
Há menos de um ano, falava-se pouco sobre a lucratividade e muito sobre o importante alto e rápido crescimento das startups. Porém, os dias atuais apresentam um ambiente econômico muito incerto, e as empresas de capital de risco hoje aplicam due diligences mais minuciosas nas startups, focando mais na lucratividade.
Com esse cenário pouco otimista, qual deve ser o próximo passo das startups para não ficarem a ver navios? Acompanhe.
O debate “crescimento X lucro” nas startups não é novo, mas a maioria dos empreendedores e capitalistas de risco seguiam as palavras de Paul Graham ("startup = crescimento") e priorizavam até então o crescimento acima da lucratividade. Esse crescimento pode significar um aumento no número de clientes, mais resultados em vendas ou até o aumento na força de trabalho. O importante era crescer para dominar o mercado pretendido o mais rápido possível.
Esse crescimento tem duas maneiras de acontecer:
Organicamente: quando a empresa cresce ganhando mais clientes e usuários para seus produtos ou serviços.
Aquisição: adquirindo outro negócio ou fazendo parceria com outros negócios.
Os investidores geralmente preferem o crescimento orgânico para medir o desempenho de uma empresa.
Mesmo sem ver lucros por um período, os investimentos e a queima do caixa eram capazes de sustentar as operações e a expansão da empresa por um tempo importante. A justificativa era a busca por taxas de crescimento meteóricas.
Foi assim com empresas importantes, como Uber, WeWork, Spotify e Twitter. Sim, essas são empresas bilionárias sem lucro algum. A gigante Amazon, de Jeff Bezos, levou 9 anos para gerar os primeiros lucros para seus acionistas. Porém, a Amazon cresce a um ritmo tão rápido que é justificável que use parte de seus lucros de hoje para reinvesti-los no crescimento. (Porém, se uma empresa não cresce rápido o suficiente, ela deve tomar outros caminhos com seus lucros, como devolvê-los aos acionistas.)
Focar no crescimento foi uma estratégia positiva quando as taxas de juros estavam sob controle e a adoção de novas tecnologias estava em larga escala.
Porém, o cenário mudou. O custo do capital foi reajustado mundialmente, o fantasma da recessão tomou conta dos mercados e a rota do risco foi recalculada: chegou ao fim os anos dourados de Venture Capital.
Uma startup se torna lucrativa quando ela ganha mais dinheiro do que o necessário para suas despesas operacionais. Porém, apenas cerca de 40% das startups atingem o almejado ponto de equilíbrio (o famoso breakeven point).
Parece simples: lucros são sinais de boa saúde financeira e viabilidade do negócio. Se as coisas apertarem devido a mudanças no consumo, aumento da concorrência, custos de fornecedores mais altos ou instabilidades econômicas, uma startup lucrativa teria recursos financeiros para administrar a situação com mais calma.
Além disso, a maior vantagem seria poupar seus fundadores da busca exaustiva por financiamento externo, despriorizando assim ações importantes no negócio durante este período. Essa estabilidade financeira garante também a desejada independência na gestão.
Embora o mundo das startups tenha historicamente priorizado o crescimento como status quo, o cenário mudou recentemente. Os investidores hoje estão mais preocupados com a saúde financeira das empresas que podem ser comprometidas não só devido a esse shift do mercado, mas também por um possível escalonamento imprudente.
Hoje, muitas startups trabalham em um mercado mais tradicional e competitivo (ou evoluem para esse público para ganhar mais mercados). Neste caso, sacrificar a lucratividade para tentar garantir um crescimento rápido pode ser perigoso, pois aumenta a exposição ao risco, e, a longo prazo, podem ser superados por concorrentes com uma oferta melhor.
O cenário de crescimento desenfreado, baseado em um planejamento pobre, com queima de caixa irresponsável e prejuízos operacionais foi o modus operandi por muito tempo no mundo das startups. O mercado se tornou insustentável e desconfiado.
A lucratividade então se tornou prioridade.
Simplificando a matemática do lucro:
Receita - Custo das Mercadorias Vendidas (CPV) = Lucro Bruto (também chamado de Margem Bruta) - Custos operacionais = Lucro
Em geral, os fundadores já mudaram o foco no alto crescimento para lucratividade. Isso se comprova pelo alto número de layoffs vistos nos últimos meses. O desafio é o tempo que se levará para que essas startups provem seu progresso.
Com base no que foi discutido no artigo, você pode seguir os seguintes passos para equilibrar crescimento e lucratividade em um tempo mais hábil:
Apenas se atenha que mudar o foco para acelerar o lucro não significa que os investidores queiram que o negócio pare de crescer. Em vez disso, eles vão querer que ele cresça de forma mais sustentável, enquanto geram lucro. Sem dúvida, pegará muitos fundadores desprevenidos, mas é uma pivotagem que precisa ser feita o quanto antes.
Gerenciar o crescimento e o lucro da sua startup, concentrando-se no que é importante tanto no hoje, quanto no longo prazo, é uma habilidade crucial. O que é ainda mais importante é a capacidade de ajustar a estratégia à medida que o mercado se altera.
Ter a habilidade de demonstrar o caminho para o lucro colocará as startups em uma posição muito mais confiante frente aos investidores. Ter uma ênfase maior no sucesso sustentável, mantendo-se conservador em seus planos de crescimento, também tranquilizará os investidores em potencial.
Essa abordagem não é benéfica apenas para os investidores. A longo prazo, será interessante para os fundadores essa mudança de mentalidade, tornando sua jornada nos negócios mais saudável.
Esse recálculo de rota está forçando os empreendedores a se concentrarem na construção de negócios mais sustentáveis, e aqueles que sobreviverem a esta nova realidade certamente permanecerão no mercado por mais tempo.
As startups com negócios mais comprovados não correrão o risco de fecharem suas portas diante de uma economia enfraquecida e ainda poderão esperar para levantar dinheiro (se necessário) em condições mais favoráveis. Os investidores definitivamente continuarão buscando oportunidades de investimento em novas empresas, mas os planos rumo a lucratividade precisarão também estar em destaque na sua apresentação.